Aquele realmente parecia um dia diferente logo ao amanhecer.
Na primeira caminhada pelas ruas, já nos primeiros encontros, as pessoas
demonstravam estarem mais comunicativas e dispostas a “soltarem o verbo” como
se diz popularmente. A primeira pessoa que encontrei logo me disse; “você sabia
que o terreno onde será construída a nova unidade de saúde do bairro é menor do
que o projeto?” “Impossível”, retruquei, “quem seria capaz de realizar um
projeto assim?” “Pois bem, é real”, afirmou a pessoa, complementando que a obra
estaria parada para adaptações no projeto aprovado, já que o edifício não
caberia em cima do referido terreno.
Continuo minha caminhada e encontro outro cidadão disposto a
fazer comentários inesperados. Vem ele: “na nova obra que contemplará ainda
mais crianças em nossa educação municipal, existe uma rampa de acessibilidade”.
“Que bom”, comento. “Está na hora de todos atentarem para este importante
detalhe que facilitará a vida de nossos amigos cadeirantes”. “Sim, mas você
acha normal que para chegar até a rampa de acessibilidade haja degraus?”
“Impossível”, retruquei novamente, “quem seria capaz de realizar um projeto
assim?” disse eu pela segunda vez. “Está lá para quem quiser ver, degraus para
então chegar até a rampa”. Preferi continuar caminhando.
No encontro seguinte, mais uma indagação; “você sabia que os
funcionários públicos, tanto da prefeitura quanto das secretarias, passam o dia
no Facebook, em horário de trabalho, comentando desde política até assuntos
aleatórios?” “Impossível”, falei pela terceira vez. “Não existe uma lei interna
que proíbe acesso às redes sociais em horário de expediente?” “Sim, mas e quem
é que cumpre esta lei estando com os monitores ali à sua frente, com o Facebook
convidando para umas “curtidas”?” “Dia estranho”, pensei.
Mais a frente, outra pessoa, outro comentário: “você sabia
que as duras críticas às administrações públicas de nossa cidade nas rádios e
na televisão, são apenas porque os atuais prefeitos ainda não fecharam
contratos de divulgação com os veículos?” “Sério?” perguntei. “Mas os veículos
não deveriam viver de anúncios publicitários ao invés de contratos altíssimos e
direcionados?” “O certo seria, mas não é assim”, disse o cidadão. “pode ver na
TV as duras críticas diárias de uma emissora importante de nosso estado, “pau
no governo” até que o mesmo resolva assinar uns contratos milionários de mídia,
depois é só elogios”. “Mundo cão”, pensei novamente.
Muitas paradas e pessoas depois, alguns comentários sobre o
projeto de uma nova câmara de vereadores que deverá ser alterado antes da
conclusão da obra, alguns banheiros adultos que deveriam ser infantis, um chefe
de gabinete que já foi o maior opositor do mandatário, um prefeito que não
governa mas é governado, uma esposa de mandatária elevada à secretária de
educação, uma ponte que todos sabem que balança e que os laudos dizem que não
balança e muito, muito mais... obras, notas fiscais, carteis, edifícios,
direcionamentos, diárias... “Que dia é hoje?” perguntei a mim mesmo. “Quantas
histórias fantasiosas e sem nenhum sentido!”
Naquela noite, somente ao deitar a cabeça sobre o travesseiro
é que tive aquele momento de lucidez que muitos chamam de “caiu a ficha”. Era
1º de abril, dia da mentira. Ah! Agora entendi o porquê de tantas histórias
fantasiosas e nada verdadeiras. As pessoas aproveitaram o dia para contar
anedotas, aplicar pegadinhas. Ufa! Que bom amanhecer no dia 2 sabendo que nada do
que havia ouvido no dia anterior era verdade. “Funcionários públicos o dia todo
no Facebook, obras mal projetadas, desperdício de dinheiro público e “otras
cositas mas”. Bah! Quanta mentira”.
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